A Cidade da Covilhã comemora 139 anos.
E tal como há quatro anos, esta celebração ocorre depois de um outro evento relevante da democracia local ter tido lugar: as Eleições Autárquicas.
Neste sentido, quero começar por saudar todos os covilhanenses que expressaram no passado dia 11 de Outubro o seu sentido de voto, felicitar quem venceu, saudar todos os eleitos e, em particular, os que tal como eu, aqui estão pela última vez nessa qualidade.
A Covilhã e o Concelho vivem dias difíceis. Alguns indicadores evidenciam essa realidade. Em Agosto de 2009, 3813 trabalhadores estavam desempregados, o que corresponde a cerca de 15% da população activa do concelho. O número de beneficiários de rendimento social, que em 2004 era de 574, hoje é 3 vezes superior, abrangendo 1833 pessoas, equivalente a 3,5% da população residente. E todos os dias surgem novas dificuldades. A nova cara da pobreza, sejam estudantes universitários, sejam famílias despedaçadas pelo desemprego, tem na base uma crescente e injusta distribuição da riqueza que não é de hoje, não é só consequência da crise, antes resulta, em aspectos essenciais, das políticas que o Governo Sócrates I, aprofundou e agravou.
E é justamente por isso que vale a pena aqui lembrar, desde logo pelo significado politico que encerra, que poucas horas depois das eleições legislativas que deram maioria relativa ao PS, o INE publicava os dados referentes à estimativa do défice público para 2009, nesse mesmo dia comunicados ao gabinete de estatística da União Europeia. De acordo com o INE, Portugal deverá terminar 2009 com um défice orçamental de 9 658,7 milhões de euros, o que deverá representar 5,9% do PIB (refira-se que em nossa opinião e tendo em conta a informação divulgada pela Direcção Geral do Orçamento até final de Agosto, o défice deverá ser bem superior, podendo mesmo ultrapassar os 7% do PIB). E que nesse mesmo dia a Lusa publicava a notícia de que a Comissão Europeia abrirá em Novembro um novo procedimento por défice excessivo contra Portugal, devido à ultrapassagem do limite dos 3% estabelecido no Pacto de Estabilidade.
Ou seja, como sempre acontece nestas coisas, não é o Governo PS a vir falar no défice orçamental, pois primeiro vêm os organismos oficiais alertar para os pretensos perigos, para depois muito pesaroso vir o executivo tomar as medidas draconianas que pretensamente é obrigado por imposição externa a tomar – corte brutal do investimento público, redução dos apoios sociais, redução do nº de trabalhadores e dos salários reais, privatização de serviços públicos, deterioração das funções sociais do Estado - para poder controlar o défice orçamental.
Ou muito nos enganamos, ou passados os meses em que tudo pareceu cor de rosa - e veja-se o aumento dos preços de electricidade – e as coisas vão voltar a ficar negras para os mesmos de sempre – os trabalhadores, os micro e pequenos empresários, os reformados e os pensionistas, os mais frágeis, sendo que, como é evidente, isto não augura nada de bom no que diz respeito aos recursos financeiros que o Estado Central disponibilizará para as autarquias nos próximos anos.
Senhoras e Senhores
Ter uma ideia para a cidade, para o concelho, um projecto, um sonho, um paradigma, uma utopia, é natural e aconselhável. Mas importa ter sempre em conta algumas questões fundamentais.
A primeira é que a cidade e o concelho, mais do que pontes, largos, praças e ruas, são as pessoas que aqui vivem e trabalham e é para elas que os responsáveis públicos devem ter sempre as atenções viradas como ponto de partida, fonte permanente de inspiração e destinatários exclusivos da sua actividade. Muitas delas, vivendo muito mal, não conformadas em umas serem filhas e elas enteadas, sem esquecer a pobreza envergonhada. E que tem que se acorrer a todos, mesmo com meios escassos, o que implica a definição participada de prioridades e a canalização urgente de mais apoios para quem mais precisa.
A segunda é que a cidade sobrevive aos brilharetes. Há uma cidade que recebemos que é a que vamos deixar, se possível com valor acrescentado. Onde as marcas que pusermos devem evitar o acessório, o efémero, o show off, a obra de fachada e dar prioridade à (re)construção de alicerces que permitam a elevação da qualidade de vida, sobretudo quando há ainda tanto, e coisas tão importantes para fazer e necessidades básicas para suprir.
A terceira é que quem mais investe na cidade são os particulares. Mas daí não decorre a máxima “o promotor é quem mais ordena”. Importa que invistam cada vez mais, com regras, em que arrecadar mais-valias traga contrapartidas públicas para a melhoria das condições da cidade e do concelho que é de todos. O município realiza, ou é chamado de urgência a realizar, obra directamente. Mas a sua função é também reguladora, licenciadora. E nisso inclui-se o poder que os munícipes conferem de apenas aprovar projectos de acordo com as características essenciais de identidade e distintivas da cidade, preservando sistemas de vistas, a relação com a Serra mas também e cada vez mais com o Rio, promovendo o desenvolvimento equilibrado de funções, actividades económicas, etc.
Mesmo quando as receitas diminuem e os encargos aumentam, isso exige, não cedências prejudiciais, como aconteceu frequentemente nestes últimos anos, com a privatização de bens e serviços públicos essenciais, como a água, mas a reconsideração, sim, da partilha transparente e equitativa de recursos entre os diferentes níveis da administração e os vários sectores de actuação.
A quarta é que tendo a cidade problemas, não precisa de mais. Isto significa que o humano desejo de protagonismo, deve concentrar-se no que é essencial, prioritário. Os excessos de ego, seja em palavras ou em betão armado, não podem sobrepor-se aos interesses colectivos.
Apresentámos e defendemos há bem pouco tempo, os eixos estratégicos e propostas que consideramos essenciais para uma Covilhã socialmente mais justa e democrática, mais solidária, geradora de emprego com direitos, urbanisticamente equilibrada e sustentável; Uma Covilhã que seja uma referência cultural e desportiva, onde a opinião das pessoas seja ouvida e respeitada e onde a defesa da coisa pública, o rigor, a transparência sejam verdadeiros pilares da actuação autárquica.
Em síntese, um projecto de desenvolvimento integrado assente em duas ideias chave: Conhecimento e Sustentabilidade.
Conhecimento, porque a Covilhã, cidade de saberes únicos e ancestrais, reúne condições excepcionais no panorama da Beira Interior, para se afirmar como um verdadeiro Município do Conhecimento. Porque apostar no Conhecimento é a condição essencial para atrair e fixar população e quadros, e para que o desenvolvimento tenha como matriz a elevação das condições de vida da população.
Sustentabilidade, garantindo que as soluções para a habitação, mobilidade, ambiente, energia, economia, produção cultural e outras, são construídas respeitando o contexto histórico, paisagístico, ecológico, adequadas aos recursos disponíveis e valorizadoras das potencialidades endógenas, ou seja daquilo que nos pode diferenciar e afirmar como território de solidariedade e e de futuro onde, e repetindo as palavras de Fernando Paulouro, ainda é possível, «(..) salvar a comum humanidade, a árvore e a casa, a rua e o portal, a sóbria harmonia dos lugares(…)».
Termino com algumas notas, breves, e em jeito de balanço, sobre a Assembleia Municipal.
É com total franqueza que digo que gostaria de trazer aqui o testemunho duma Assembleia Municipal que fosse um espelho das virtudes da democracia! Mas a realidade é que não é muito luminoso tudo quanto possa dizer a respeito do que tem sido o seu funcionamento e da importância com que nos últimos anos a vem encarando esta maioria e este executivo camarário.
Durante a campanha eleitoral, ouvimos dizer, e é um facto, que todas as opiniões se puderam sempre exprimir desde que respeitem os tempos regimentais. Era o que faltava que não o pudessem fazer! Mas é também um facto que se essas intervenções foram uma que outra vez, capazes de conquistar um tempo não regateado, situações houve em que a incomodidade provocada se ia fazendo tão excessiva que a palavra era abruptamente retirada. E é ainda um facto que a essas opiniões sempre houve alguém que as escutou. Mas, a pergunta é, de que modo? Por via de regra, com indiferença e frequentemente, apoucando, amesquinhando, tudo o que não fossem as profundíssimas razões da maioria que sabe sempre absolutamente tudo de absolutamente tudo, por confronto com as oposições, por definição minoritárias, que não sabem nunca nada de coisíssima nenhuma, nunca lhes assistiu a mais leve réstia de razão. Vezes demais, confundiu-se a procura do bem comum, que há-de ser o objectivo último de um órgão do poder legitimado no voto, com a satisfação dos desígnios da maioria de serviço.
Lamentamos por isso que a Assembleia Municipal da Covilhã, não tenha sido, e não foi por nós que o não foi, o verdadeiro Fórum da Cidade e do Concelho, aberto e estimulador da participação dos cidadãos, do debate, do confronto vivo de ideias e projectos, espaço de cultura, de educação, força viva e actuante no desenvolvimento e progresso do Concelho.
Hoje estamos em casa nova.
Apesar de consideramos desadequada a sua inserção urbana, e da sua inauguração ter constituído, como tantas outras, uma despudorada operação eleitoralista, o nosso desejo sincero é o de que às novas condições hoje ao dispor de cidadãos, funcionários, eleitos, corresponda tanto quanto uma casa nova significa recomeço, uma nova atitude da maioria, uma postura mais democrática que fomente a construção de uma Assembleia Municipal onde vigorem o respeito e consideração de todas as opiniões, a consideração de todos os interesses (ainda dos mais antagónicos) e de todas, mas absolutamente todas, as pessoas que integram a nossa comunidade.
Foi bom trabalhar com todos, e a todos os que em breve iniciam um novo mandato, deixo um abraço e votos de bom trabalho.
Em nome dos eleitos do PCP e da CDU, posso afirmar e estou certo de que o propósito que sempre nos animou, o de contribuir construtiva e activamente para o desenvolvimento equilibrado da Covilhã, para a melhoria das condições de vida de quem aqui habita, trabalha e estuda, para a defesa de uma gestão comprometida com a defesa do interesse público, aberta e tolerante, onde todos sejam tratados da mesma forma, continuará a orientar a nossa forma de estar e a determinar a nossa intervenção.
Viva a Covilhã!