PERÍODO ANTES DA ORDEM DO DIA

26/6/2010

 Durante mais de trinta anos, Portugal e os portugueses foram sujeitos à mesma orientação política, implementada pelo PS, PSD e CDS, coligados ou isoladamente, mas sempre convergentes, que conduziu o país e a população à situação de calamidade económica e social em que hoje se encontra. Essa política de direita, com ritmos diferenciados mas objectivos comuns, destruiu o tecido produtivo, acentuou a nossa dependência externa, criou mais de setecentos mil desempregados, acentuou a desertificação de grandes áreas do território nacional e tornou Portugal num dos países europeus com maiores desigualdades sociais.

Mas se esta é a triste realidade com que hoje nos confrontamos, seria perfeitamente estúpido que não conseguíssemos analisar outras facetas desta situação. Ao longo das últimas décadas, sempre com o véu da crise com que nos querem estupidificar, construíram-se e reconstruíram-se colossais fortunas que, na sua maioria, resultaram da parasitagem dos recursos nacionais.

Com a embaladora ideia da modernização, levou-se a cabo um processo meticuloso de destruição da nossa agricultura, da nossa indústria, das pescas e de outras actividades fundamentais, construindo um economia de casino, assente na especulação financeira, na agiotagem e, muitas vezes, no crime económico e na corrupção que se expandiram intocáveis numa clara coligação entre grandes grupos económicos e os seus delegados nos órgãos de poder político.

Nos últimos anos, enquanto se constituíam grandes fortunas particulares nessa dita economia de jogo e especulação, as próprias entidades financeiras que tal proporcionavam criaram dividas institucionais que isentavam os seus proprietários. Perante essa situação, numa campanha sem precedentes na nossa história económica, através da transferência de milhares de milhões de euros do orçamento do Estado para tais instituições, fomos todos nós, uma vez mais, a abastecer as tesourarias que outros delapidaram em proveito pessoal e irresponsabilidade de gestão. Também aqui o crime continua a compensar e a ser premiado.

Agora, para além da desestruturação económica, utiliza-se a consequência deste saque aos dinheiros públicos, que se traduziu num acentuar do deficit, para justificar medidas de profunda austeridade e injustiça mas que, no fundo, não passam de mais do mesmo em relação às que nos têm aplicado nestas três décadas.

Os que não têm qualquer responsabilidade nesta crise, e são a maioria dos portugueses, são eles próprios expurgados dos seus frágeis rendimentos para compensar quem criou o problema. Ao mesmo tempo, encobrindo-se com a tal crise, levam-se a cabo as medidas mais penalizadoras do pós 25 de Abril, corroendo drasticamente alguma democracia social conseguida ao longo de décadas de luta das populações e defendendo um neoliberalismo que tanto se criticou, mas que agora se pretende revitalizar com os traços mais negros do capitalismo selvagem do século XIX.

Também no plano do Poder Local esta campanha constitui uma violência inqualificável sobre as autarquias e as populações. Não só se pretende extorquir meios financeiros a que as autarquias têm direito constitucional, como se acentua a destruição dos escassos serviços públicos que ainda restavam às populações das regiões mais deprimidas, como é o concelho de Idanha-a-Nova.

Após a destruição das poucas estruturas produtivas do interior, do encerramento de muitos serviços de correios, da redução significativa dos cuidados de saúde, do encerramento das escolas com o inevitável acentuar do processo de desertificação, numa inqualificável lógica do “quanto prior melhor”, PS e PSD unem-se também no combate às acessibilidades das regiões que tanto delas necessitam para sobreviver e tentar desenvolver-se.

Há anos que o IC31 vai sendo prometido, em períodos de campanha eleitoral, pelo PS e pelo PSD, para, logo que assumem a cadeira do poder, colocar no lixo ou no congelador tal projecto. Como se tal não bastasse, veio o governo do PS avisar do próximo pagamento de portagens na A23, eixo fundamental de ligação da Beira Interior com os centros de decisão deste país macrocéfalo e desequilibrado. A razão, mais que aceitável, da não existência de portagens por ausência de alternativa rodoviária, foi rapidamente esquecida.

Por sua vez, o PSD, a pretexto da intolerável introdução de portagens noutras regiões do norte litoral, corrobora também esta política do PS como que dizendo “já que se mata, esfola-se”. Numa acção de populismo sem alicerce, tentando responder à contestação popular naquelas regiões, avança com proposta de penalização total – já que pagam uns, pagarão todos. Ou seja, em lugar de apoiar a contestação de populações e autarquias do norte à tentativa de introdução de portagens, antecipa-se à divulgada intenção do PS e pretende generalizar o mal a todo o país, incluindo as populações servidas pela A23.

Sabemos que não somos uma ilha, embora nos vão empurrando cada vez mais para tal situação. Por isso, não podemos ter a atitude da avestruz e alhearmo-nos do que se passa no país, sobretudo quando a política nacional ofende profundamente as nossas populações e penaliza severamente a nossa região.

Neste quadro, não compreendo a passividade desta autarquia e desta assembleia, tal como não compreendo a acomodação dos nossos presidentes de Junta, ignorando e deixando passar ao lado as constantes violências a que a nossa região, o nosso concelho e as nossas gentes são sujeitas.

Jornal «Avante!»

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